1. Dr. Farina, fale-nos sobre sua formação, especialização e trajetória junto à SBCP-SP.
Concluí a graduação médica na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) em 1988. No ano de 1989, prestei serviço militar como médico do Exército no Hospital de Guarnição na cidade de Porto Velho (RO). Minha formação de residência médica em Cirurgia Geral ocorreu de 1990 a 1992, e em Cirurgia Plástica de 1992 a 1995 no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto (HCFMRP-USP). Fui o primeiro residente da recém-inaugurada Residência Médica de Cirurgia Plástica no HC-FMRPUSP no ano de 1992, quando concorri por concurso para a única vaga/ano credenciada pelo Ministério de Educação e Cultura (MEC). O serviço de Cirurgia Plástica do HCFMRP-USP foi fundado em 1980, pelo Prof. Dr. Werther Guilherme Marchesan, onde até 1991 somente estagiavam os residentes de Cirurgia Geral. No final de 1994, obtive aprovação na prova de título de Especialista pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.
Ingressei na pós-graduação acadêmica e concluí o Mestrado em 1998 e o Doutorado em 2003 na USP-Ribeirão com estudos em microcirurgia reconstrutiva sobre a eficácia da hemodiluição normovolêmica moderada na prevenção de trombose em microanastomoses vasculares. No ano de 2004, fui aprovado para membro Titular da SBCP quando apresentei trabalho versando sobre o “Tratamento da Mão Queimada”.
No ano de 2007, fui aprovado em concurso da Universidade de São Paulo para docente da Divisão de Cirurgia Plástica na FMRP-USP em regime de dedicação exclusiva, função que iniciei em março de 2008. Desde então, precisei assumir a chefia da Divisão, função que exerço até os dias atuais. No período de 2011 a 2012, concluí meu pós-doutorado nos Estados Unidos na Universidade de Wisconsin-Madison na área de bioengenharia para o tratamento de feridas. Em 2019, defendi a tese de Livre-Docência pela USP-Ribeirão Preto, intitulada “Contribuição da integração entre ensino, pesquisa, extensão e gestão para a abordagem terapêutica de feridas complexas”.
Logo após meu ingresso como cirurgião plástico docente da FMRP-USP, trabalhei para o credenciamento de nosso serviço junto à SBCP, o que ocorreu no final de 2008. Em março de 2009, realizamos a 1ª Jornada de Cirurgia Plástica da FMRP-USP após o credenciamento junto à SBCP. Desde então, já realizamos cinco Jornadas da Divisão de Cirurgia Plástica da FMRP-USP em Ribeirão Preto, sempre com o importante apoio oficial da SBCP Regional São Paulo.
2. Como chefe da divisão de cirurgia plástica da FMRP-USP, qual a estrutura atual e principais atividades exercidas aos residentes?
Atualmente, a Divisão de Cirurgia Plástica da FMRP-USP conta com a atuação de outros docentes como o Prof. Dr. Pedro Soler Coltro, em regime de tempo parcial e, mais recentemente, o Prof. Dr. Carlos Eduardo Fagotti de Almeida passou a atuar como Docente Colaborador em caráter voluntário, além do Prof. Dr. Marcus Castro Ferreira como Colaborador Sênior.
Outros cirurgiões plásticos fazem parte do serviço na formação de nossos residentes. Na função de médicos assistentes, temos atualmente três colegas: Drª. Cristina Marly Cunha Hetem, Dr. Marcelo Felix da Silva, Dr. Carlos Eduardo Fagotti de Almeida. Como médicos adidos (voluntários) no HCFMRP-USP, contamos com três cirurgiões plásticos: Drª. Gabriela Lustri Eiras Schwartzmann, Drª. Sabina Aparecida Alvarez de Paiva e Dr. Ederson Alexandre Cintra.
As atividades de ensino são realizadas no HC Campus e na Unidade de Emergência, bem como em outros hospitais estaduais. No Hospital Estadual de Américo Brasiliense, contamos com a colaboração do Dr. Antônio Albacete Neto, Dr. Roberto Marino e Dr. Rodolfo Müller Pereira e, no Hospital Estadual de Ribeirão Preto, o Dr. Caio Freitas Neves também atua na supervisão dos nossos médicos residentes. Procuramos atender todas as orientações da Matriz de Competência em Cirurgia Plástica estabelecida pela SBCP em conjunto com a Comissão Nacional de Residência Médica na formação dos residentes de primeiro, segundo e terceiro anos, oferecendo-lhes formação em cirurgia reparadora e estética.
No corrente ano, uma tendência que vem gerando preocupação é uma maior falta de interesse dos jovens cirurgiões plásticos em atuar no serviço público. É curioso, pois o exemplo prévio de vida financeira e profissional progressivamente bem sucedida e estabelecida dos nossos mestres, trabalhando em dupla jornada, com meio período nas suas atividades privadas e o restante do tempo dedicado às atividades assistenciais, de ensino e pesquisa no HCFMRP-USP parece não mais motivar muitos jovens atualmente. Percebe-se uma preocupação demasiada dos jovens cirurgiões plásticos com seus pretensos ganhos financeiros rápidos na “carreira solo”, muito influenciados, a meu ver, pelas mídias sociais vigentes. Outro fator agravante é a ausência de renovação automática de concursos públicos pelo Estado para suprir as vagas de servidores aposentados ou daqueles que se desligaram do hospital. Hoje, existe uma carência significativa de profissionais da Saúde nos hospitais públicos. Esta somatória de fatores pode resultar em maior vulnerabilidade do sistema público para a assistência desta população carente do SUS, e que necessita de atendimento de maior qualificação, dado o nível terciário de complexidade demandado no HCFMRP-USP. Mas não é somente a assistência que sofre. O ensino de qualidade e a pesquisa também sofrem, pois a falta de jovens médicos interessados na vida universitária aponta um futuro preocupante na contribuição universitária para o nosso país. Espero que a mudança atual de governo do Estado recomponha urgentemente as perdas de recursos humanos na Saúde Pública e que mais cirurgiões plásticos possam dedicar parte do seu tempo profissional em prol da população mais vulnerável no SUS.
3. Qual a importância dos eventos científicos da SBCP Regional São Paulo realizados nos últimos anos em Ribeirão Preto?
Os eventos científicos realizados em Ribeirão Preto com apoio da Regional São Paulo têm sido muito importantes na troca de conhecimento e experiências entre colegas da especialidade, além do fortalecimento de amizades que carregamos para sempre. As nossas jornadas sempre procuram abranger temas de cirurgia reparadora e estética, servindo de incentivo e aprimoramento para a aplicação de novos conhecimentos técnicos e incorporação dos avanços da tecnologia na área da Cirurgia Plástica. Nos eventos anteriores, algumas vagas foram ofertadas para alunos de graduação e da Liga Acadêmica de Cirurgia Plástica, possibilitando o despertar de vocações para a nossa especialidade. Para o próximo ano, a diretoria atual da SBCP Regional São Paulo, representada pelos caros colegas José Octavio Gonçalves de Freitas, Flávio Henrique Mendes e Jorge Luiz Abel está nos presenteando com a realização da Jornada Paulista do Interior em nossa cidade de Ribeirão Preto, no campus da USP-Ribeirão.
4. Quais as sugestões de temas da cirurgia plástica estética e reconstrutiva para os próximos eventos em sua região?
Os diversos temas de cirurgia reparadora e estética, bem como as novas tecnologias, são sempre bem-vindos nos nossos eventos. No entanto, o conhecimento da prevenção e do tratamento das feridas complexas, nas suas várias etiologias, parece que vem se tornando cada vez mais importante para os cirurgiões plásticos, pois a sua prevalência vem crescendo na população com o aumento da expectativa de vida. No Brasil, é essencial a formação de cirurgiões plásticos capacitados para atuar como reconstrutores, possibilitando a recuperação e reabilitação dos pacientes que apresentam feridas complexas, incluindo as queimaduras, permitindo muitas vezes o seu retorno à vida normal, com a resolução de suas feridas. O fechamento das feridas, evitando-se amputações, traz de volta a autoestima e dignidade aos pacientes. A necessidade de afastamento do trabalho na população de pacientes com feridas complexas é prejudicial não somente aos seus portadores e familiares, mas para a sociedade com um todo, inclusive sobrecarregando a previdência social.
Outro tema importante é o da cirurgia craniofacial. Neste ano de 2022, iniciamos mais uma separação de gêmeas craniópagas. Em 2018, tivemos a enorme satisfação de colaborar na separação complexa e exitosa das gêmeas craniópagas Maria Ysabelle e Maria Yzadora. O caso atual é semelhante, e já realizamos duas cirurgias em conjunto com a equipe de Neurocirurgia Pediátrica, com o apoio de mais de 40 outros profissionais de várias equipes do HCFMRP-USP. De acordo com o planejamento, serão necessários pelo menos mais três procedimentos cirúrgicos até a separação total dos corpos prevista para meados de 2023, com a reconstrução dos crânios e suas coberturas cutâneas. Portanto, este tema nos parece também importante para ser abordado na Jornada Paulista do Interior, programada para 21 e 22 de abril de 2023 no campus da USP-Ribeirão.